Entendendo e avaliando os jogos coletivos (parte 2)

79aea9c0e5a76f5e6ffc183b3f1ebbd8Inicialmente os estudos focavam-se na distância percorrida pelos jogadores em uma partida. Posteriormente o número, tipo e frequência das ações motoras realizadas durante o jogo. Entretanto, como aponta Garganta(2), a grande variabilidade entre os resultados dos jogos levou a um questionamento natural no meio científico. Até que ponto estes resultados são aplicáveis e reais? Até que ponto as informações de um jogo, com toda sua complexidade e variabilidade, pode ser útil para outro. Se duas equipes se enfrentarem duas vezes não saberemos sequer quem irá vencer! Muito menos pode-se prever que ações serão realizadas. Neste sentido a estatística descritiva predominava nas análises. Geralmente os movimentos são agrupados em categorias (mas quantas, já podem ocorrer “n” situações?) e depois descrito a frequência de ocorrência de uma determinada situação(1). Apesar dos benefícios deste tipo de tratamento, como já apontado, as ações nos jogos coletivos dependem de um contexto.

Assim, visando solucionar este problema, as interpretações passaram a ser realizadas levando em consideração o contexto no qual foram obtidas (ex.: característica do oponente, placar e etc) e sua representatividade nos jogos com características semelhantes. Tem-se focado, então, nas ações consideradas representativas ou que causam desequilíbrio na relação ataque/defesa(2). Na estatística passou-se a utilizar medidas de comparação levando em consideração as ações realizadas em função de um critério – por exemplo posição tática do jogador (pesquisas indicam que diferentes funções táticas realizam atividades diferentes em jogo. O que em princípio é óbvio(3). Mas isso pode depender do esporte em estudo), diferenças em função do rendimento das equipes (como o placar final da partida, comportamento no campeonato ou equipes de categorias diferentes) e o gênero (homens e mulheres se comportam de maneira diferentes).

Como já mencionado, os jogos coletivos são marcados por uma desordem aparente (tudo pode acontecer). Entretanto, acredita-se existir algum critério de ordem específicos do bom desempenho. É isso que as pesquisas tentam encontrar. Os estudos descritivo-comparativos não tem condições de perceber esta “ordem”. Eles descreve a “ desordem”(1). Por isso ainda são poucos os estudos que permitem predizer o desempenho. Visando melhorar este cenário, teorias de análises de sistemas complexos tem sido utilizados. As variáveis situacionais geralmente consideradas são a qualidade do opositor, condição da partida (como o placar) e local do jogo (jogar em “casa”). Para cada uma destas variáveis um conjunto de preocupações deve ser tomada(1).

Visando melhorar o momento de obtenção dos dados, a literatura(2) sugere que deve-se ter sempre em mente  a busca pelo método mais adequado para a modalidade e para aquilo que se pretende descobrir (investigar). Portanto, o que geralmente pretende-se saber é (a) quem executa a ação?; (b) como e que tipo de ação?; (c) onde foi realizada; e (d) quando foi realizada (2). Os estudos atuais pretendem conhecer a tática mais eficaz – o comportamento ideal ou comum em determinadas situações.  Entretanto, como já citado, os jogos coletivos são característicos por sua aleatoriedade e imprevisibilidade – o que dificulta por vezes até mesmo o procedimento estatístico utilizado. Se por um lado, mesmo com algum rigor científico mais simples tem-se dificuldade de entender o que está acontecendo, muito mais dificuldades terá um técnico por meio da simples observação entender e recordar tudo o que está acontecendo.

A variabilidade e imprevisibilidade das ações de um jogo coletivo associado a subjetividade como algumas informações podem ser julgadas dificulta uma análise precisa do que aconteceu(2, 3). Além disso, por vezes acredita-se em uma capacidade infundada de perceber toda a complexidade de um jogo pela simples observação (vários jogos, adversários diferentes e etc!). Interessante citar que estudos realizados sobre esta temática indicam que os técnicos experientes apresentam mais falhas de interpretação do que os iniciantes em suas análises. Por isso que os métodos científicos são importantes. Mas a sugestão é que haja um equilíbrio entre o rigor científico e aquele conhecimento baseado na experiência(2). Um conjunto de dados não necessariamente transmite uma informação. É determinante que haja um julgamento por parte do avaliador.

A observação precisa ser ativa, sistematizada, com um problema específico para solucionar e obedecendo certos padrões. É fundamental que haja uma sistematização na recolha das informações. Também é importante atentar-se a escolha do tratamento estatístico utilizado (característica e limitações). Após esta etapa, deve-se avaliar o que os números significam. Devido a própria característica de imprevisibilidade do jogo, este momento é muito importante e dependerá de grande participação do observador.

Bons treinos!

Leituras sugeridas:

1. Marcelino R, Sampaio J, Mesquita I. Investigação centrada na análise do jogo: da modelação estática à modelação dinâmica. Revista Portuguesa de Ciências do Desporto. 2011;11(1):481-99.

2. Garganta J. A análise da performance nos jogos desportivos. Revisão acerca da análise do jogo. Revista Portuguesa de Ciências do desporto. 2001;1(1):57-64.

3. Watts DJ. Tudo é óbvio: desde que você saiba a resposta (como o senso comum nos engana). São Paulo: Paz e Terra; 2011.

Deixe um comentário

Your email address will not be published. Required fields are marked *

*